Especialistas em inteligência artificial (IA) ouvidos nesta terça-feira (12) na Câmara dos Deputados defenderam modelo regulatório flexível e descentralizado para o setor. Eles participaram de debate da comissão especial que analisa o PL 2338/23 , sobre governança e regulação dos sistemas de IA.
Segundo eles, o projeto em análise na Câmara está mais alinhado ao modelo europeu e precisa de ajustes para evitar o que chamaram de "carga regulatória desproporcional". Essa abordagem, explicaram, traria impactos negativos à eficiência competitiva das empresas nacionais, sobretudo de startups e pequenas empresas, à medida que aumenta os custos da inovação.
Atualmente, destacam-se dois modelos regulatórios de IA: o mais prescritivo e centralizado, adotado pela União Europeia (IA Act), e outro mais próximo da autorregulação e da descentralização, em vigor nos Estados Unidos.
No caso do Brasil, a diretora de transformação digital do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Cristiane Rauen, aposta em um "modelo tropicalizado" adaptado às condições do mercado doméstico.
Conforme ela explicou, o ideal seria evitar o "compliance ex ante", quando as regras são impostas antes do uso da IA, o que, na sua visão, aumenta a burocracia e dificulta a inovação para pequenas empresas, além de ser pouco responsivo às mudanças tecnológicas.
“Para nós, é interessante ter um modelo de equilíbrio, que não seja muito punitivo do ponto de vista da inovação. Um modelo de regulação assimétrica, ou seja, quanto maior o risco de aplicação da IA, maior a carga regulatória e maiores os deveres que têm de ser aplicados”, defendeu.
Nesse ponto, o relator da proposta, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), disse que a definição sobre qual modelo regulatório será adotado deve ser uma decisão de Estado e não de partidos políticos, com base na soberania do país. “Se nós não tivermos isso, nosso dado não vai estar sobre o nosso controle”, reforçou.
Informações sigilosas
“Não é trazendo modelo copiado da Europa que vai funcionar bem no Brasil”, afirmou Jean Paul Torres Neumann, executivo da Confederação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro), que representa as empresas de TI afetadas pelo projeto de lei.
Crítico do projeto, ele disse que o texto pode prejudicar a competitividade da indústria ao expor informações estratégicas de empresas. "A empresa deixa de ser competitiva por divulgar informações que são sigilosas", apontou. Ele se referiu ao artigo do projeto pelo qual os desenvolvedores de IA devem compartilhar avaliações de impactos algorítmicos de alto risco com as autoridades setoriais do sistema.
Pela proposta, caberá à autoridade competente pelo sistema, a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), a decisão sobre os critérios gerais para a avaliação de impacto algorítmico. Já a autoridade setorial ficará responsável por definir em quais hipóteses a avaliação de impacto algorítmico será flexibilizada. O projeto não aponta quem decide em casos de divergências.
Como sugestões ao colegiado, Neumann propôs a criação de linhas de crédito e de incentivos fiscais específicos para IA, semelhantes às previstas na Lei de Informática . Além disso, defendeu a inclusão no marco regulatório do compartilhamento de supercomputadores, como medida de redução de custos.
Excesso de regras
O representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Rodrigo Pastil Pontes, classificou a proposta do marco regulatório de "excessiva" ao regular desde a concepção e desenvolvimento da tecnologia até o uso. Para ele, o texto “quebra o desenvolvimento da inovação”, prejudicando a competitividade.
Pontes defende que a regulação da IA enfatize os usos de alto risco e não na tecnologia em si, com exclusão de aplicações de baixo e médio risco que não utilizem dados humanos.
Pela proposta em análise na Câmara, a ANPD, como "autoridade competente" pela gestão do sistema, será responsável por regulamentar a classificação da lista dos sistemas de IA avaliados como de alto risco. Essa centralidade de decisões na agência foi um dos pontos mais criticados do projeto.
Potência em dados
Na avaliação de Cristiane Rauen, o Brasil é uma potência em termos de dados que podem ser usados para o aperfeiçoamento da IA. Segundo ela, hoje existem 175 milhões de usuários cadastrados no PIX e 169 milhões de contas ativas no site gov.br.
"É uma oportunidade gigante para o Brasil se posicionar em relação aos dados: o que queremos desses dados e como esses dados podem ser melhor beneficiados dentro de uma legislação da IA que não enfoque apenas a defesa de direitos e o compliance positivo, mas que associe essas duas pontas ao fomento do setor", concluiu a representante do MDIC.
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